Retrato de Infância

Certa manhã acordei bem cedo, vi o sol nascer, estava frio na rua.
Deixei-me estar na cozinha, fazendo companhia à minha mãe, que me cumprimentara com um doce e quente beijo de bom dia na minha testa.
Observava-a atentamente a preparar as coisas para o meu pai enquanto o dia nascia lá fora.
Tomava o meu pequeno-almoço e pouco depois ouvia:
- Até logo, filha – era o que ouvia, era o que o meu pai me dizia todos os dias habitualmente, quando acordava antes do dia começar a nascer novamente.
Mal a temperatura lá fora ficava agradavelmente quente, pegava em mim e na minha bicicleta e ia dar uma volta até chegar a hora de almoço.
Regressava a casa e almoçava; depois, sem demora, voltava a ir dar uma outra volta de bicicleta.
Nessa tarde, decidi ir até aos montes de areia que o meu vizinho Relvas tinha. Fui para lá escondida, entrei pelo mato e fui como uma penetra. Seguia até aqueles altos montes de areia, subia-os e fazia deles, seguidamente, escorrega, sem que ninguém me visse. Divertia-me bastante naquela imensa areia, que eu espalhava.
Só ia para casa quando a voz da minha mãe se fazia ouvir.
- CARINAAAAA, onde estás? - A sua voz entoava ao longe. Os vizinhos mal a ouviam, já sabiam que eu não estava em casa. Eu, por medo, ia para casa. Nessa tarde, fui cheia de areia, parecia eu própria terra, de tão suja que estava.
Cheguei a casa e, é claro, que a minha mãe me chamou à atenção, uns gritos seguidos de um banho frio.
Naquele tempo, fugia todos os dias, ia dar grandes voltas de bicicleta pelas redondezas, ia arejar. Fugia ao desconforto que sentia em estar em casa.
Essas fugas faziam-me sentir que a minha infância estava viva e sentir o que realmente eu era.
Eu era uma criança, uma simples criança. De bicicleta...

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